A sensação que provoca saber que um dia o mundo vai continuar sem mim não é linear. Por vezes leva-me a querer fazer mais, aproveitar ao máximo a oportunidade única e noutros instantes é difícil reconciliar o porquê de tomar ação se um dia vou ser esquecido.
Periodicamente lembro-me da minha própria mortalidade, a sensação é paradoxal, distante porque ainda estou no início da minha vida, mas próxima pela inevitabilidade. Esta impõe uma limitação temporal na vida, leva-me a considerar qual o propósito das ações que tomo. Eu não exijo uma ordem cósmica que justifique tudo, gostava apenas de ter relação numinosa com as ações do meu dia a dia.
Para lidar com o processo doloroso que é o término da nossa existência, fomos criando narrativas que adicionam persistência no plano terrestre. Conceitos como patrimônio, contribuições para a humanidade e ainda as estruturas espirituais, ou seja, narrativas transcendentes.
É complexo definir como podemos contribuir para o mundo de uma forma significativa, especialmente agora, uma vez que temos acesso a virtualmente todas as contribuições. As nossas ações são diluídas pela comparação constante, porém, temos que ter presente que a forma como podemos ter um impacto positivo é acima de tudo localmente, nas comunidades onde interagimos diretamente. É desta forma que conseguimos observar o impacto real das nossas ações. Não te esqueças que existes num período de globalização e as tuas escolhas têm consequências pelo mundo.
Como mencionei, as narrativas espirituais têm um papel fundamental a estabelecermo-nos no mundo. Olho à minha volta e observo que a grande maioria dos meus contemporâneos são irreligiosos e ateus, tendo em conta o contexto histórico isto faz sentido. Em Portugal identifico a negação da tradição católica cristã. A clássica rebeldia que impulsiona o desmantelar das tradições. Quero salientar que as estruturas que levaram a humanidade a desenvolver estas religiões continua a existir no homem moderno. Se esta vocação transcendente não for tomada em consideração ela não desaparece, transforma-se em niilismo e outros sistemas de adoração que nunca satisfazem a necessidade.
Eu escolho ver a morte como um mecanismo de evolução/motivação por mais dolorosa que a temporalidade seja é esse mesmo mecanismo que nos faz evoluir, tentamos melhorar a nossa condição, encontramos formas de adiar esse momento. Dum ponto de vista biológico a morte vem para fechar projetos e avaliar o que deve continuar. A morte não existe num vácuo tem o seu polo oposto a Vida, é mais agradável, mas é fundamental perceber a interligação destes dois princípios. A ligação com o mundo natural ajuda-nos a refletir no processo que se desenrola em nós, vemos estações a passar, plantas a florir e pássaros a cantar mas também as folhas caídas e o silêncio.
Ainda estou dentro do pêndulo a oscilar entre as duas dicotomias, entre a motivação e a imobilidade. Tento fomentar a visão que promove a motivação, mas sei que esta é uma jornada para a vida. Acredito que a ligação aos processos naturais ajuda a compreender os ciclos e essa compreensão oferece alguma paz. Um dia mais tarde quero visitar este texto para me relembrar a minha atual atitude.
Obrigado pela tua atenção.